tl/dr: preparei aqui um guia introdutório a partir de várias leituras e vídeos que escutei ao longo desse ano (fontes serão devidamente dadas) explicando o básico sobre o RabbitMQ e como ele pode ser um recurso interessante na infra-estrutura pra desacoplamento e comunicação entre aplicações. Meu objetivo aqui é ser mais coeso e objetivo e apresentar uma visão básica, porém suficiente pra um entendimento incial, e em português. Caso você saiba inglês, colocarei também alguns links ao longo do artigo.
RabbitMQ: conceitos básicos e motivação
Atualmente, muito se fala do RabbitMQ e message brokers como ferramentas para quebrar os "monolitos" - e aqui eu falo sem o pejorativismo que essa palavra carrega ultimamente. A distribuição de um monolito e o surgimento de arquiteturas distribuídas podem trazer vantagens como desacoplamento, maior coesão e autonomia das partes desacopladas. Essa nova arquitetura distribuída passa a se basear na comunicação entre os participantes para realizar certas ações, o que traz algumas outras complexidades. É introduzida uma camada extra, a rede, e por isso garantias de resiliência, confiabilidade e escalabilidade passam a ser ainda mais necessárias pra esse novo modo de comunicação.
Dito isso, o que é o RabbitMQ? É um message broker, um recurso que se baseia no conceito de mensageria e que funciona da seguinte forma: uma determinada aplicação publica uma determinada mensagem para o broker que recebe essa mensagem e a encaminha para uma fila. Na outra ponta, uma outra aplicação se inscreve para receber as mensagens daquela fila. Temos então alguém que publica (publisher), alguém que se inscreve pra ouvir as mensagens publicadas (subscriber) e um agente no meio que distribui e entrega essas mensagens (message broker). É o padrão pub/sub.
O RabbitMQ traz suporte à alguns protocolos diferentes, como AMQP, MQTT e STOMP. Meu objetivo aqui é ser mais introdutório, mas o Luiz Carlos Faria fala um pouco mais à fundo sobre isso nesse vídeo e numa série de posts que começa com esse aqui.
Vantag ... ou melhor, algumas considerações
- Escalabilidade: esse tipo de infra-estrutura suporta centenas de milhares produtos/consumidores de forma simultânea e possui a entrega única como característica, ou seja, cada mensagem só entregue à um consumidor.
- Mediação: uma mesma mensagem talvez precise ser entrege para n consumidores que irão processá-la de maneira diferente. O Rabbit possui mecanismos para roteamento e distribuição dessa mensagem, atuando como um mediador dentro da camada de transporte dessa arquitetura distribuída.
- Assincronicidade: o envio de mensagens assíncronas retira um ponto de falha de quem envia essas mensagens, o que deixa a aplicação que publica uma mensagem mais leve, pois desacoplou uma responsabilidade dela. Isso contudo, introduz outros possíveis pontos de falha que devem ser tratados para garantir uma aplicação resiliente. Por exemplo, ao retirar o salvamento de log de uma transação SQL dentro da sua aplicação e passando a publicar esse log num message broker pra ser consumido por outra ponta, você retira a dependência dessa transação mas inclui novos possíveis pontos de falha como, por exemplo, a rede que passa a ser uma camada de comunicação e o cliente que vai consumir as mensagens. Em um desses pontos conseguimos ter razoável controle quando publicamos, no outro não. Existem técnicas pra lidar com isso, mas não é o objetivo desse post.
Como funciona
Uma aplicação publica uma mensagem para o Rabbit. Essa mensagem então é enviada para uma exchange, que é um artefato de roteamento, fazendo uma analogia, como um carteiro responsável por fazer a entrega). As exchanges, cada qual de acordo com sua configuração, direcionam a mensagem para uma ou mais filas. Na outra ponta, existe um (ou mais) consumidor(es) responsável por escutar a fila e consumir a mensagem (mais sobre isso abaixo).
É importante dizer que se uma mensagem chegar numa fila com 3 consumidores conectados, apenas um deles receberá a mensagem para processamento (entrega única). Caso seja necessário que mais de um consumidor receba a mesma mensagem, , a exchange para qual a mensagem é enviada deve ser configurada para rotear essa mensagem para várias filas. Assim, a mensagem é replicada e entregue para n filas, permitindo consumidores independentes de uma mesma mensagem - spoiler do que vamos falar mais à frente. Aqui embaixo uma imagem do CloudAMQP para ilustrar:
O CloudAMQP (um provider de Rabbit na nuvem) tem uma série muito boa (em inglês) de RabbitMQ para iniciantes. Disponível nesse link aqui.
Quem faz o que dentro do RabbitMQ
Exchange
Sendo um pouco repetitivo, a Exchange é um artefato de roteamento que funciona como um carteiro responsável por entregar as mensagens. Quando uma mensagem é publicada numa exchange, é enviada uma propriedade (setada por quem envia) chamada routing key. Essa key funciona como o endereço do destinatário. A exchange olha a key e sabe para onde entregar.
Dito isso, Existem quatro tipos exchange no RabbitMQ:
Direct: a mensagem é enviada para uma fila com o mesmo nome da routing key. Se a routing key não for informada, ela é enviada para uma fila padrão.
Fanout: a mensagem é distribuída para todas as filas associadas (falaremos sobre isso mais abaixo). Esse tipo de exchange ignora a routing key.
Topic: a mensagem é distribuída de acordo com um padrão enviado pela routing key.
Header: a mensagem é distribuída de acordo com seus cabeçalhos. Dessa forma, é feito um match com qual consumidor deve receber aquela mensagem.
Queues (filas)
Recebem as mensagens da exchange e armazenam até que um consumidor se conecte para retirar as mensagens de lá. O nome sugere, isso é feito seguindo uma lógica FIFO (first-in, first-out). Podem ter os seguintes atributos:
- Durable: a fila sobrevive ao restart do message broker. O RabbitMQ possui um banco de dados chamado Mnesia aonde armazena essas informações.
- Exclusive: possui somente 1 consumidor e morre quando não há mais consumidores.
- Autodelete: morre quando não há mais mensagens.
Binds (associações)
Para que uma exchange entregue uma mensagem para uma fila, deve haver uma associação, um bind entre elas. Isso pode ser feito de maneira programática por quem envia ou através de uma interface web que o RabbitMQ disponibiliza para gerenciamento do broker.
Virtual hosts (vhosts)
Tudo isso que falamos acima, são entidades do RabbitMQ. Um grupo lógico dessas entidades é chamado de virtual host. Um vhost funciona como um tenant dentro do RabbitMQ, que, inclusive, é descrito (na doc sobre vhosts)[https://www.rabbitmq.com/vhosts.html] por essa razão um sistema multi-tenant.
É importante frisar que um vhost é um separação lógica e não física dessas entidades. Separar esses recursos fisicamente é detalhe de implementação de infra-estrutura.
Fire and forget 🤘🏼
Uma das premissas básicas desse tipo de recurso é que quem publica não conhecem quem consome. Quando uma mensagem é disparada, ela é entregue ao mediador e quem disparou não sabe mais sobre o seu paradeiro. Conseguimos saber apenas se ela chegou ao mediador. Por isso, sempre que algum tipo de retorno for necessário, é seguro dizer que o RabbitMQ não é o recurso adequado para ser utilizado.
Por outro lado, existem alguns lugares aonde podemos ter ganhos consideráveis com esse padrão:
- Quando não me importa o retorno da mensagem.
- Quando n workers precisam processar uma única mensagem, por exemplo, uma api REST que recebe uma requisição e distribui ela para processamento paralelo.
Quando um consumidor recebe uma mensagem, ele é responsável por dizer ao broker que essa mensagem foi consumida e que já pode ser retirada da fila. É o conceito de acknowledgement. O consumidor é responsável por emitir um ack (mais simpático, mais curto). Ao receber o ack, o Rabbit entende que o consumidor disse: ok Rabbit, já peguei e processei a mensagem, pode retirar ela da fila.
Padrões de consumo
Existem diversos padrões de consumo disponíveis, mas não é meu objetivo falar mais sobre eles nesse post. O RPC é um deles e o próprio site de docs do RabbitMQ tem um tutorial disponível aqui. Eu, contudo, recomendo que os outros tutoriais sejam feitos antes pra exercitar.
E agora, como eu testo isso tudo?!
Provisionando
De maneira rápida, existem duas maneiras que eu recomendo pra se começar a utilizar o RabbitMQ para aprender desenvolvendo.
Conta free no CloudAQMP. Importante dizer que esse post não é um ads pra eles, embora eu já os tenha citado algumas vezes. É só porque eles tem um vasto conteúdo pra iniciante e permitem uma conta free. A desvantagem da conta free é que ela funciona dentro de uma infra-estrutura compartilhada do RabbitMQ, como um virtual host (um assunto-futuro, quem sabe).
Subindo um container no Docker. Eu costumo ter isso nos meus docker-compose.override.yml, mas um comando para subir de primeira é esse aqui:
docker run -d --hostname my-rabbit --name some-rabbit -p 5672:5672 15672:15672 rabbitmq:3-management
O usuário e senha padrão para conexão e acesso da GUI são guest/guest.
Utilizando o RabbitMQ com .NET Core
Existem uma série de bibliotecas que implementam com boas práticas um service bus e trabalham algumas garantias como resiliência para falhas na conexão com o broker, mas não é o objetivo mostrá-las. Pra esse exemplo, basta criar duas aplicações console em .NET Core a adicionar a cada uma o package RabbitMQ.Client pelo seguinte comando:
dotnet add package RabbitMQ.Client
Publisher: console app em .NET Core
Importante: nos dois códigos abaixo vocês vão ver que eu não especifiquei o vhost na conexão. Quando isso acontece, é criada uma conexão ao vhost padrão /.
using System;
using System.Text;
using RabbitMQ.Client;
namespace RabbitMQDemo.Publisher
{
class Program
{
static void Main(string[] args)
{
var connectionFactory = new ConnectionFactory()
{
HostName = "localhost",
Port = 5672,
UserName = "guest",
Password = "guest",
};
using (var connection = connectionFactory.CreateConnection())
using (var channel = connection.CreateModel())
{
while (true)
{
Console.WriteLine("Type your message");
var teste = Console.ReadLine();
channel.QueueDeclare(
queue: "tests",
durable: false,
exclusive: false,
autoDelete: false,
arguments: null);
string message =
$"{DateTime.Now.ToString("dd/MM/yyyy HH:mm:ss")} - " +
$"Message content: {teste}";
var body = Encoding.UTF8.GetBytes(message);
channel.BasicPublish(exchange: "",
routingKey: "tests",
basicProperties: null,
body: body);
}
}
}
}
}
Consumer: console app .NET Core
using System;
using System.Text;
using RabbitMQ.Client;
using RabbitMQ.Client.Events;
namespace RabbitMQDemo.Consumer
{
public class Program
{
static void Main(string[] args)
{
var connectionFactory = new ConnectionFactory()
{
HostName = "localhost",
Port = 5672,
UserName = "guest",
Password = "guest"
};
using (var connection = connectionFactory.CreateConnection())
using (var channel = connection.CreateModel())
{
channel.QueueDeclare(
queue: "tests",
durable: false,
exclusive: false,
autoDelete: false,
arguments: null);
var consumer = new EventingBasicConsumer(channel);
consumer.Received += (sender, eventArgs) =>
{
var message = Encoding.UTF8.GetString(eventArgs.Body);
Console.WriteLine(Environment.NewLine + "[New message received] " + message);
};
channel.BasicConsume(queue: "tests",
autoAck: true,
consumer: consumer);
Console.WriteLine("Waiting messages to proccess");
Console.WriteLine("Press some key to exit...");
Console.ReadKey();
}
}
}
}
Output das aplicações de exemplo
Resumo
O objetivo desse post foi dar um overview básico e o caminho das pedras pra quem quiser se aventurar nesse mundo de sistemas distribuídos com brokers de mensageria. Existem uma série de outras preocupações que esse tipo de arquitetura trazem como: o message broker passa a ser uma parte vital de sua infraestrutura, então ele precisa ter disponibilidade na última casa decimal dos 99,99999....%.
Por fim, gostaria de lembrar que não existem balas de prata. Por isso, pense com cuidado e avalie se cabe na sua aplicação. O RabbitMQ é um recurso incrível, assim como são arquiteturas distribuídas, mas que pode(m) trazer sérias dores de cabeça e prejuízos para o negócio se aplicados sem necessidade e/ou de forma errada.
Top comments (5)
Parabéns pelo artigo Mateus. Gostei muito da maneira como abordou o RabbitMQ para iniciantes. Gostaria que tivesse aprofundado um pouco mais sobre o RPC e sobre como ele endereça as questões de comunicação em 2 vias. Se é uma solução efetiva ou não?
Opa, primeiramente muito obrigado Renato! Feliz que tenha ajudado.
Eu tenho mais alguns materiais arquivados aqui nesse sentido de modelos de comunicação com o RabbitMQ, e um deles é o RPC. Vou formatar melhor pra postar e comento aqui te avisando assim que o fizer!
Fantástico Mateus!
Aliás, obrigado pela referência...
Opa, eu que agradeço Luiz (pelo conteúdo e pelo comentário)!
Seu artigo me ajudou, obrigado e parabéns!